Conforme o Artigo 332 do Código de Processo Civil declara , são hábeis a provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não expressamente tipificados na lei.
Com efeito, tema pertinente em matéria probatória se refere a chamada prova emprestada , a qual pode ser definida como aquela que, já havendo sido utilizada como prova em um processo, é transposta, sob forma de prova documental, para um outro processo, de idêntica ou diversa natureza.
Nesse sentido, a eficácia da prova emprestada, via de regra admitida no processo civil, fica sujeita a certas limitações, devendo sempre se atentar quanto a possibilidade de sua admissão ,e na sua valoração, a efetividade do exercício do contraditório em relação a mesma.
Analisemos, pois, algumas situações que nos traz MARINONI .
A) Prova emprestada em relação a meios de prova os quais sempre admitem contraditório integral posterior
“Inicialmente, pode-se cogitar a respeito da aceitação do uso da prova emprestada em relação a meios de prova que sempre admitem contraditório integral posteriormente à sua produção. É o caso da prova documental. Essa prova – não importa o momento em que tenha sido colhida ou o processo em que tenha sido produzida – sempre admite que as partes possam exercer seu direito de contraditório – seja pela produção de prova contrária, seja pela impugnação do seu teor ou das suas formalidades. Em relação a tal meio de prova não há dificuldade em aceitar o empréstimo, ressalvados os casos em que outras garantias possam interferir em seu translado” [1]
B) Prova emprestada de processo com plena identidade de partes
“Em segundo lugar, pode-se imaginar a tentativa de empréstimo de uma prova (não documental) de um processo para outro, ambos contendo as mesmas partes. Nessa hipótese também não há dificuldade em aceitar a prova emprestada. Havendo, excepcionalmente, necessidade de se cogitar sobre novos fatos, ou sobre novos enfoques dados aos fatos – v.g., a necessidade de ouvir a testemunha a respeito de outra questão, ou sobre aspecto da questão não examinado no processo anterior –, somente será possível emprestar a prova se for viável reabrir o contraditório a seu respeito ou, ao menos, separar a prova anterior dos novos aspectos, permitindo-se a produção de nova prova sobre as questões não abordadas anteriormente.” [2]
C) Prova emprestada de processo sem plena identidade de partes
"Por fim, cabe imaginar a situação em que se busca emprestar prova de um processo, em que litigaram “A” e “B”, para um processo entre “A” e “C”, ou para um processo entre “C” e ”D”. Nessas hipóteses, ou apenas uma das partes é identificada com a do processo em que a prova foi produzida, ou nenhuma das partes é idêntica. Em tais situações, como o contraditório das partes não foi garantido na produção da prova, será necessário examinar se é possível cumprir tal garantia no processo para o qual se pretende exportar a prova. Sempre que for possível garantir o contraditório – com a mesma eficácia que se teria caso o contraditório houvesse sido observado no processo primitivo –, o empréstimo da prova será admissível. Caso contrário, em princípio, a prova emprestada será inviável." [3]
Desse modo percebe-se a importância da identidade de partes,entre o processo do qual se extrai a prova emprestada e o processo no qual se pretende utilizar a referida prova, forte o princípio do contraditório. Em reforço, a tal entendimento, assevera Ovídio Baptista da Silva:
"Determina igualmente o valor probatório da prova emprestada a circunstância de ter sido ela formada em processo anterior entre as mesmas partes, ou entre uma delas e terceiro, ou até mesmo entre terceiros, sem a participação de qualquer delas. Em geral, a doutrina apenas admite a utilização da prova emprestada, outorgando-lhe o mesmo valor original, quando ela seja produzida perante as mesmas partes, com as mesmas garantias de contraditório, atribuindo-se à prova formada em processo de que apenas uma das partes haja participado o valor de simples presunção (LESSONA, ob. Cit., v. , p. 15; RICCI, Delle prove, n.º 16; MOACYR AMARAL SANTOS, Prova judiciária, v. 1, nº 215)."[4]
Não é diferente o entendimento jurisprudencial predominante exarado em diversos julgados do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
AGRAVO INTERNO. PREVIDÊNCIA PRIVADA. PREVI. AUXÍLIO CESTA-ALIMENTAÇÃO E ABONO ÚNICO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. JUNTADA DE PROVA EMPRESTADA. PERÍCIA ATUARIAL. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE DE PARTES. INADMISSIBILIDADE. DESENTRANHAMENTO DOS DOCUMENTOS PRESCINDÍVEIS À RESOLUÇÃO DA LIDE. POSSIBILIDADE. Inexiste cerceamento probatório, ao se indeferir a juntada de prova emprestada, consistente em perícia atuarial, após a interposição da apelação, a qual nem se fazia necessária para a resolução da lide, tampouco existe identidade de partes em ambos os feitos. Agravo interno desprovido. (Agravo Nº 70035911346, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, Julgado em 05/05/2010)
Aliás, ainda quanto ao julgado acima, releva destacar o aduzido pelo Eminente Desembargador Romeu Marques Ribeiro Filho, o qual enaltece, em seu voto, a importância da identidade de partes entre os processos, inclusive elevando-a a condição de requisito de admissibilidade da prova emprestada:
“(...) segundo Ada Pellegrini Grinover [Prova Emprestada, Revista Brasileira de Ciências Criminais, out/dez 1993, p. 60.], a prova emprestada somente seria admissível quando produzida em processo formado entre as mesmas partes , o que – gize-se, não é o caso do recurso em tela, pois, consoante sustentado pela própria agravante, à fl. 06, a prova emprestada juntada com a apelação “possui identidade com a discussão no presente feito.
Nesse sentido, é o julgado que segue:
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. FUNDAÇÃO DOS ECONOMIÁRIOS FEDERAIS ¿ FUNCEF. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PROVA EMPRESTADA. (...) CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. Sendo o magistrado o destinatário final da prova, consoante art. 130, do CPC, pode o mesmo dispensar a realização de prova pericial, bem como demais diligências, nos casos em que já formada sua livre convicção. No que se refere à utilização da prova emprestada, somente se admite tal prova, quando houver identidade das partes em ambos os feitos, o que não se configura no caso em tela. (...) PRELIMINARES RECURSAIS REJEITADAS, APELO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70030695068, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em 11/11/2009).
Conseqüentemente, com razão a ilustre Julgadora ao determinar o desentranhamento da prova pericial atuarial, tendo em vista que não se mostra imprescindível à resolução da lide, bem como pelo fato de que somente se admite a sua utilização se houver identidade das partes em ambos os feitos, o que, como mencionado, não é o caso dos autos. Inviável, por isso, a utilização de prova emprestada.” [5]
Referências
[1] [2] [3] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil, v. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2010. pgs.291-293.
[4] SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de Processo Civil, v. 1, tomo I. Rio de Janeiro: Forense, 2008. pgs. 279-280.
[5] Tribunal de Justiça do RS. Agravo Nº 70035911346, Quinta Câmara Cível, Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, Julgado em 05/05/2010)